Durante mais de 750 anos, os cardeais que elegem o novo papa têm vivido um dos processos mais secretos e controlados do mundo: o conclave. Mas entre orações, votos e silêncio, há um detalhe muitas vezes esquecido - a comida, que não é apenas sustento. É tradição, é símbolo... e, acima de tudo, é uma potencial fonte de risco.

Antes de se fecharem atrás das portas da Capela Sistina, os cardeais ainda têm tempo para saborear as últimas refeições em liberdade. Em Roma, é comum vê-los nos seus restaurantes preferidos nos dias que antecedem o início do conclave.


Mas, quando chega a hora da decisão, a realidade muda drasticamente. Os 135 cardeais ficam isolados do mundo exterior até que um novo líder, para os 1,4 mil milhões de católicos, seja escolhido. Durante este tempo, não há comunicações, apenas o famoso fumo: negro, se não há decisão, ou branco, se há novo papa.

Segundo a BBC, a comida, por mais simples que pareça, pode ser um vetor de mensagens clandestinas. Ao longo da história, houve receios de que um ravioli escondesse um recado, ou que um guardanapo sujo fosse usado para passar informação ao mundo exterior. Daí que as regras sejam meticulosas: nada de frangos inteiros, nada de empadas fechadas, vinhos e águas apenas em copos transparentes e, claro, inspeção rigorosa de tudo o que entra.


Esta vigilância remonta a 1274, quando o Papa Gregório X impôs regras apertadas após um conclave que durou quase três anos. Na altura, os habitantes locais ameaçaram racionar a comida dos cardeais para acelerar a escolha. E resultou. Desde então, o isolamento e o controlo alimentar tornaram-se norma.

No século XVI, o célebre cozinheiro Bartolomeo Scappi - uma espécie de chef, estrela do Renascimento - descreveu com detalhe o funcionamento das cozinhas papais no seu livro "Opera dell’Arte del Cucinare". Falava de pratos equilibrados, de vigilância apertada e de refeições entregues através de uma "roda" construída na parede, para evitar contacto com o exterior.

Hoje, o cenário é mais modesto, mas igualmente controlado. Durante o próximo conclave, a partir de 7 de maio, serão as freiras da Domus Sanctae Marthae a preparar refeições típicas da região do Lácio e de Abruzzo: minestrone, esparguete, legumes cozidos e arrosticini (espetadas de borrego). Nada de extravagâncias, apenas simplicidade - refletindo a linha mais sóbria e humilde defendida pelo Papa Francisco.