A nostalgia é um sentimento profundo que todos, por um ou outro motivo, sentimos.
É aquela ideia de que o tempo foi bom a dada altura da nossa vida, que não a atual.
A maioria das coisas melhora com a passagem do tempo, as partes boas parecem melhores e as partes piores desvanecem como uma cicatriz indelével, mas muito discreta. Tudo parece menos mau.
A nostalgia até é meio perigosa, se pensarmos bem nisso, uma caótica ex-relação de repente parece menos má: “Oh… ela atirou-me um prato à tromba, mas fora isso até era querida. Devia ligar-lhe.”
Um antigo chefe de m*rda parece melhor quando comparado com o atual, porque a dor atual é sempre mais real do que a que passou.
“Sim, o meu chefe era um urso, mas ao menos não me ligava fora de horas. Devia ligar-lhe.”
A nostalgia é um sentimento tão forte que está presente em todos os momentos da nossa vida.
O cheiro a relva molhada de repente invoca uma memória de infância e desbloqueia um sentimento feliz. Um pouco como se a memória reenquadrasse coisas más como se fossem potencialmente boas.
“Ahhh este cheiro a frio faz-me lembrar a minha ex. Devia ligar-lhe.”
Agora, porque é que eu estou a falar disto? Primeiro, porque me apetece e o texto é meu. Segundo, porque dei por mim a ouvir uma música que me transportou para os meus dias de adolescência, não interessa qual foi. O que interessa é que eu nunca tinha ouvido aquela música e, de repente, um som transportou-me para uma época mais feliz da minha vida.
Estava eu a andar de skate com amigos, numa tarde de verão, a velocidade de existência era mais lenta e eu tinha “zero preocupações”.
A Ideia de “zero preocupações” é a nostalgia a funcionar, porque nunca houve na vida de ninguém um momento com zero preocupações.
“Ahhh quando és bebé não tens preocupações!” Está bem, está.
Experimenta viver a vida sem saber quando é que vais comer ou sem perceber nada do mundo. Deve ser mesmo fixe. Claro que passam o tempo todo a chorar.
As preocupações eram diferentes, mas existiam e não eram menos importantes, só parecem menos importantes porque o tempo lhes retirou peso.
E ainda bem, talvez essa seja a melhor vantagem do tempo, ter o poder de aliviar o peso de coisas que eram pesadas.
Agora, fará sentido continuarmos a tentar encontrar felicidade através da nostalgia? É que vivemos sempre a tentar ser felizes revivendo velhas glórias. Isso não é triste?
De repente estamos a recuperar músicas antigas, a fazer remakes de clássicos ou a ir para sítios onde fomos felizes, tudo isto em vez de criarmos coisas novas.
Além disso, muita da nostalgia nem é bem nossa. (Apertem os cintos porque vamos entrar no reino do metafísico.) Grande parte das imagens de ideais felizes que temos, vêm de histórias que nos contam, de livros que lemos ou de filmes que vemos.
São ideias de felicidade artificialmente fabricadas que cimentam o nosso imaginário e são o motivo pelo qual, quando eu ouço sonoridades dos anos 80 (década em que nasci, mas não foi a década onde cresci e consolidei as memórias.), de repente me imagino a levar uma miúda ao baile de finalistas do liceu, nos EUA.
Não deixa de ser uma sensação incrível: Eu e ela, lindos (mais ela que eu), a dançar por baixo de uma bola de espelhos, enquanto o bully, capitão da equipa de futebol americano, se rói de inveja.
O problema é que não é real e não pode ser… a nostalgia é importante, maravilhosa, mas perigosa.
Se calhar o melhor é concentrarmo-nos no que pode vir a ser.
Até porque se a nossa existência foi boa a dada altura, porque é que não há de ser outra vez?
Ouve aqui todos os episódios no Podcast Dudas de un Hombre.