Os meus filhos comem animais.

Calma, estou a falar de animais cozinhados, comem animais cozinhados.

Não estou a dizer que vamos passear pelo bosque para eles irem apanhar o almoço.

“Vão! Tragam comida!”, grito eu, brandindo uma lança, a minha cara coberta com pinturas.

De repente, um deles aparece com um esquilo na boca, “Apanhei jantar”, clama triunfalmente, todo sujo de lama e cheio de pelos nos dentes.

Não é nada disto.

Eles comem animais cozinhados (carne, peixe), mas está a ser um problema, porque começaram a insurgir-se e a dizer que não querem comer mais animais.

Nós, na nossa humilde casa, vemos programas de televisão sobre vida selvagem, por isso eles compreendem que “animal come animal” e é a lei da natureza.

Contudo, agora já associam os animais ao que comemos e, como gostam dos animais, já não os querem comer.

Já tinha encontrado esta pequena lomba existencial no passado, quando uma vez falei de carne de vaca e eles perguntaram, “porque é que se chama carne de vaca?” e a minha mulher explicou-lhes que era por causa de vir de uma vaca, o que eu achei má ideia, mas ela quis dizer a verdade, por causa daquilo da educação e da honestidade. Enfim, frescuras. (Blá blá blá blá, facilita a tua vida, senhora.)

E, obviamente, que eles acharam mal e gerou discórdia, mas depois esqueceram-se e pensei que estava tudo bem.

Contudo, todavia, no entanto, fomos a um restaurante recentemente, em que a senhora do restaurante veio à mesa e trouxe uma lagosta viva para os clientes escolherem.

Os meus filhos iluminaram-se como uma árvore de natal, com a lagosta, porque está viva e não perceberam logo qual o propósito. Para eles era só um animal amigo que iam conhecer.

A senhora perguntou se eles queriam a lagosta, e eles, muito sorridentes e felizes responderam que sim.

E a senhora perguntou, “Boa, vão comer os dois?” e eles aí ficaram meio confusos.

“Comer? Mas está viva”, constataram com inocência.

“Pois, mas nós matamos”, respondeu a senhora prontamente.

E foi uma pequena transformação na cara deles de um “sim!” para um “Ahhhh não, não, não, não, não”

A senhora percebeu que ali não ia dar, então foi tentar vender a lagosta a outras mesas.

Infelizmente, os meus filhos não iam desistir assim tão facilmente, e foram no encalço dela, dispostos a tornar aquela noite bastante difícil para toda gente que estava naquele estabelecimento.

(eu, os clientes, os empregados, pessoas que iam a passar, etc.)

Posicionaram-se atrás da senhora e sempre que ela tentava vender a lagosta a uma mesa, lá estavam eles a gritar, “Não comam!!! A LAGOSTA ESTÁ VIVA!!!!!!!”, na esperança de demover qualquer comprador incerto.

A certa altura mandaram a senhora do restaurante ir soltar a lagosta no mar.

E ela disse que sim, dando-lhes esperança, mas eles tinham que pagar o preço da lagosta. E foi aqui que os venceu, porque, entre gastar o dinheiro para isso ou para um lego do Harry Potter ou dos Vingadores, eles preferiram o Lego.


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