Duarte Pita Negrão: "O meu filho tem superpoderes!"
O Duarte tem opiniões. Fundamentadas? Ahah Não. Sérias? Hmmm também não. Valem a pena? Errr… boa pergunta!
O meu filho de 3 anos tem super poderes.
É possível que ele veja o futuro, mas eu não sei se estou muito feliz com isso.
Passo a explicar o cenário que levantou suspeitas. Estava eu a vesti-lo, e ele, de forma muito terna, encostou as pequeninas mãos dele às minhas bochechas, agarrou-me na cara e, mergulhando nos meus olhos, disse:
“Gosto tanto de ti, Pai. Não quero que morras…”
Até aqui nada de grave, volta e meia as crianças falam de mortalidade, é relativamente comum.
Eu respondi pacientemente “ Não tens que te preocupar, filhote, o pai em princípio não vai morrer já.”
Ao que ele profeticamente, contrapôs, “Eu sei, é só daqui a uns dias…”
Largou-me a cara, virou costas e começou a afastar-se. A escassos metros, acrescentou, por cima do ombro, em surdina “No penhasco”.
E foi-se embora.
Bom, escusado será dizer que senti um leve momento de pânico.
“Qual penhasco?” e ele não respondeu
“QUAL PENHASCO, JOAQUIIIIIM?”
As minhas perguntas ficaram a ecoar no vazio, porque ele nem olhou para trás.
Quando o confrontei novamente com a situação, ele disse que não sabia do que é que eu estava a falar. Foi daqueles momentos de blackout em que ele teve uma premonição, canalizando um poder maior, e depois nem se lembra.
Qualquer coisa como, “VAIS MORRER NO PENHASCO.” dito com voz cavernosa e depois com voz normal “ O quê? Hun? Desculpa, tive um blackout.”
Parecia a professora de adivinhação do Harry Potter, Sibila Trelawney.
Desde então tenho, tido muito cuidado, sempre que alguém me desafia para qualquer coisa pergunto logo, “É perto de um penhasco?”
Se for não, contem comigo…
Mas e se for uma daquelas profecias auto-realizáveis? Uma espécie de efeito pigmalião em que o medo de ir ao penhasco é o que me leva, a dada altura, ao penhasco.
Pior, depois dei por mim a pensar “e se for um penhasco emocional?”
“Uma queda emocional de um penhasco de soberba. Uma espécie de uma queda do alto dum monte de vaidade, directamente para um buraco de incerteza, passando por um banho de realidade?”
Será que o verdadeiro poder do meu filho é, na realidade, excesso de metáforas?
Ou será que o poder dele nem é a profecia, mas sim, dizer-me o que eu tenho que ouvir para acordar para a vida.
Porque quando sabemos que vamos morrer num penhasco, temos a liberdade, para viver tudo o resto, sem medos.
Finalmente temos coragem de desafiar a mulher que nos encanta, para dançar?
Podemos despedir-nos do emprego e arriscar.
Conseguimos ir ao palco e cantar em frente a uma multidão
Nada disso nos vai matar, porque nada disso é um penhasco. Sabermos como vamos morrer torna-nos invencíveis em tudo o resto.
Claro que, se essas coisas correrem mal, uma pessoa pode sentir-se tentada a procurar um penhasco, o que nos traz novamente à profecia auto-realizável.
É muito complexo, é um nó no cérebro.
Ou então estou a exagerar e isto tudo é só porque ele viu o rei leão há pouco tempo e foi por cair de um penhasco que o Mufasa “bateu as patas”.
Provavelmente é isso. Provavelmente posso estar descansado ao saber que está tudo bem e afinal posso morrer de todas as outras formas.
Uff.
Ouve aqui todos os episódios no Podcast Dudas de un Hombre.